No das outras é refresco

Bernardo Kircove
blog du K.
Published in
3 min readSep 29, 2013

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Estou atrasado. Vinte e cinco dias atrasado. Foi quando eu quis escrever sobre isso: há vinte e cinco dias. Mas isto é só uma introdução tola.

Eu gosto do humor do Kibe Loco. Há muito tempo que acompanho o blog, de longevidade impressionante para o meio. De uns tempos pra cá, gosto igualmente do humor às vezes (muitas vezes) machista do Porta do Fundos também. É engraçado.

Pois bem. Você lembra de uma campanha da Gillete do, se não me engano, ano passado? Era terrível. Sabrina Sato e as gêmeas do nado sincronizado convocavam os homens a se depilarem porque — você sabe — pelos são nojentos. É, meio ofensivo.

O Antônio Tabet (o Kibe por trás do Kibe Loco) ficou extremamente ofendido. Ele, auto-descrito como “tenho pelos no peito”, achou aquilo tudo uma merda. Eu também. Nas palavras do próprio:

“Falo principalmente do constrangimento de testemunhar uma marca mundialmente conhecida tentando impor um padrão estético em pleno século XXI. É praticamente a contramão de onde uma sociedade mais evoluída tem de ir.” (Vai no original, se quiser)

To contigo, cara. Tenho barba também e não curto que alguém fale em rede nacional que isso é nojento. Mas, sejamos sinceros, eu não me ofendi tanto assim. Acho que, acima de tudo, fiquei mais constrangido mesmo. Embora nunca tenha pisado em uma agência de propaganda, acredito que meu diploma de publicitário me dá o direito de odiar publicidade mal feita.

Teve certa repercussão a campanha e a resposta do Kibe. Lembro porque estava conversando com meus amigos sobre isso no Santos Dummont, antes de pegar um voo para Minas na época. Todos acharam uma merda também. Mas acho que a maior discussão daquele dia era porque diabos a gente estava saindo do Rio enquanto começava o carnaval. Enfim, outro tópico esse.

Mas porque eu estou falando isso? Porque no dia 4 de setembro eu vi este post no blog:

Uou, pera lá, amigo. Sério? Me chame de chato, mas lembrei imediatamente da baiana rodada com a campanha da Gillete.

Oprimir e impor padrão estético é uma merda, lembra? Mas é difícil lembrar disso quando nós somos os opressores. E vamos combinar, né, mi amigo, tratando-se de pêlos, somos mais opressores que oprimidos. Afinal, mulher nenhuma pode ter perna peluda que vira filhote de Chewbacca.

Ok ok, estou pegando o Kibe pra cristo aqui. A ocasião faz o ladrão, certo? Bem, acredite ou não, minha intenção aqui não é falar de feminismo e/ou o direito de mulheres terem ou não terem pêlo onde quer que seja. Feminismo é um tópico interessante, mas eu não me proponho a discutir com muita frequência. É complicado.

É complicado porque — e é disso que estou falando aqui — na posição de dominante, é foda falar de qualquer tabu opressor. É por isso que muitos homens, mesmo quando o são, relutam em dizer que são feministas. Ou hétereos marchando a causa anti-homofobia. Rico defendendo pobre. Por aí vai. De maneira nenhuma, eu acredito que o representante da classe opressora deve ficar de fora da discussão (ou luta). Não mesmo. É ótimo que esteja e parte da mudança vem daí.

Agora, é preciso ter cuidado. É um terreno escorregadio e, quando se menos percebe, você esbarra na própria opressão e questiona seu eu-ativista. Me chame de covarde desta vez, mas eu não saio por aí falando que sou feminista, mesmo estando quase sempre deste lado da discussão. Vai que, no inconsciente, eu não correspondo à posição? Custo a acreditar que, numa sociedade estruturada em conceitos machistas, eu não protagonize papel opressor vez ou outra. Como falei, é uma posição covarde, porque não é disruptiva. É fora do eixo, mas não muda — apenas apoia a mudança. Bem, até muda, lentamente, através da própria atitude. Mas não parte ao meio o status quo.

De qualquer maneira, o recado foi dado: quando estiver no lado dominante, preocupe-se mais com o que você faz do que com o que você diz. E se você for homem, branco, hétero e de classe média, tenha cuidado dobrado: você pode acabar se envergonhando. Lembre-se que você senta na cabeça de todo mundo.

Eu não sou exatamente contra todo tipo de cliché, então vou retornar o assunto e, com um cliché pós-moderno, finalizar: Kibe, errou feio. Errou rude.

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